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Vol. 96. Núm. 1.
Páginas 27-33 (01 Janeiro 2021)
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Vol. 96. Núm. 1.
Páginas 27-33 (01 Janeiro 2021)
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Percepção da doença, estratégias de enfrentamento e qualidade de vida na fase inicial da micose fungoide
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Oz Segala,
Autor para correspondência
oz.segal@gmail.com

Autor para correspondência.
, Naama Trumperb, Felix Pavlotskya, Gil Goldzweigb, Aviv Barzilaia
a Departamento de Dermatologia, The Chaim Sheba Medical Center, Tel Hashomer, Ramat Gan, Israel
b School of Behavioral Science, The Academic College of Tel Aviv‐Yaffo, Israel
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Figuras (1)
Tabelas (2)
Tabela 1. Dados demográficos e clínicos dos pacientes
Tabela 2. Correlações significativas entre todas as variáveis do estudo
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Resumo
Fundamentos

A micose fungoide é o tipo mais comum de linfoma cutâneo de células T. A maioria dos casos de micose fungoide em estágio inicial segue um curso indolente, portanto é considerada pelos médicos condição relativamente benigna. Entretanto, como a micose fungoide é considerada um tipo de câncer, os pacientes podem ter uma percepção diferente.

Objetivo

Investigar a percepção da doença pelos pacientes e sua relação com a qualidade de vida, depressão, ansiedade e estratégias de enfrentamento em pacientes com micose fungoide em estágio inicial.

Métodos

Foi realizado estudo transversal baseado em questionário. Pacientes de um centro médico terciário único preencheram o Revised Illness Perception Questionnaire, a escala MF/SS CTCL‐Quality of Life, a Hospital Anxiety and Depression Scale e a The Mental Adjustment to Cancer Scale.

Resultados

Trinta pacientes (25 homens, 5 mulheres, média de idade de 51,60 anos) com micose fungoide estágio I foram incluídos. A micose fungoide teve pequeno impacto na vida diária dos pacientes, na sua qualidade de vida e nos níveis de depressão e ansiedade; os pacientes geralmente lidaram bem com a situação. A compreensão da doença era baixa e estava negativamente correlacionada com o comprometimento da qualidade de vida e depressão. Os pacientes consideravam que o estresse e as preocupações constituíam a etiologia da doença.

Limitações do estudo

Uma pequena amostra de pacientes foi incluída.

Conclusão

Pacientes com micose fungoide em estágio inicial adaptam‐se bem à doença. As intervenções psicológicas devem ter como objetivo melhorar a estratégia de enfrentamento da doença pelos pacientes e aumentar a compreensão a fim de manter alta qualidade de vida.

Palavras‐chave:
Impacto psicossocial
Micose fungoide
Qualidade de vida
Texto Completo
Introdução

Micose fungoide (MF) é o tipo mais comum de linfoma cutâneo de células T (LCCT), responsável por quase 50% de todos os linfomas cutâneos primários. É doença rara, com taxa de incidência de 6,4 por milhão de pessoas nos EUA.1 Na maioria dos casos em estágio inicial, a MF tem curso clínico indolente e apresenta bom prognóstico. Os dermatologistas familiarizados com a doença podem considera‐la relativamente simples, especialmente em seus estágios iniciais, e transmitir tal posicionamento a seus pacientes. No entanto, como a MF é um tipo de linfoma, é importante entender como os pacientes percebem este diagnóstico e como isso afeta suas vidas, pois há carência de pesquisas nessa área.2 Além disso, é preciso lembrar que mesmo os pacientes com MF em estágio inicial são obrigados a passar por avaliações médicas frequentes e receber tratamentos que podem sobrecarregar suas vidas e afetar suas percepções com efeitos psicológicos.3 Tratamentos da doença em estágio avançado podem exigir ainda mais dos pacientes.4

O conceito de percepção da doença é baseado no Common‐Sense Model of Self‐Regulation (CSM).5 De acordo com o modelo, quando as pessoas ficam doentes, elas criam crenças subjetivas sobre sua doença. Tradicionalmente, essas crenças são agrupadas em cinco dimensões: (1) identidade – o rótulo colocado na doença e os sintomas associados a ela; (2) causas – ideias sobre como alguém fica doente; (3) consequências – sequelas esperadas da doença; (4) linha do tempo – expectativas sobre a duração e o curso da doença; e (5) controlabilidade/cura – crenças sobre até que ponto pode ser controlada.6

A percepção da doença é um importante fator regulador que afeta o universo emocional dos pacientes e os comportamentos relacionados à saúde. Por exemplo, descobriu‐se que a percepção em pacientes com artrite reumatoide afeta funções psicológicas como a depressão, ainda mais do que a gravidade.7 Em pacientes asmáticos, as crenças sobre a controlabilidade/cura influenciam muito a aderência ao tratamento.8 Isso mostra que as percepções da doença têm implicações práticas em relação ao manejo.

A percepção da doença foi estudada em uma pequena amostra de pacientes com LCCT, indicando que eles percebem como sendo de longa duração; têm mais fé no tratamento médico do que na sua capacidade pessoal de tratar sua doença; e que eles não entendem sua doença.2 Ao contrário de alopecia, vitiligo, psoríase e dermatite atópica, os efeitos da percepção na ansiedade e depressão e nas estratégias de enfrentamento e qualidade de vida (QV) ainda não foram abordados em pacientes com MF.9–11 Prestar atenção à QV de pacientes dermatológicos é de grande importância, pois lidar com uma doença de pele, em especial um linfoma, pode ser muito desgastante e é considerada a quarta causa principal de desgaste em doenças não fatais.12

As estratégias de enfrentamento são a maneira como os pacientes aliviam o estresse quando confrontados com eventos traumáticos, como ser diagnosticado e ter que conviver com uma doença. A QV é afetada não apenas pela condição médica objetiva e pelas percepções dos pacientes, mas também por sua estratégia de enfrentamento.13 As estratégias de enfrentamento também estão associadas aos níveis de estresse emocional.14

Nosso objetivo foi investigar os aspectos psicodermatológicos de pacientes com MF em estágio inicial. O objetivo principal foi avaliar a percepção da doença, estratégias de enfrentamento, ansiedade e depressão. Com foco na QV dos pacientes, o objetivo secundário foi aprender como esses fatores a influenciam.

Materiais e métodos

Este foi um estudo baseado em questionário. O estudo foi aprovado pelo IRB (3925‐17‐SMC).

Participantes

Pacientes com MF em estágio inicial (estágio I), diagnosticados, tratados e acompanhados no centro médico, que foram informados sobre sua doença pelo menos quatro semanas antes de sua inclusão, foram recrutados durante a visita ao ambulatório ou clínicas de fototerapia. Os pacientes receberam informações e preencheram os questionários descritos a seguir.

Medidas

Para avaliar a percepção dos pacientes sobre sua doença, usamos o Revised Illness Perception Questionnaire (IPQ‐R).6 Essa escala é dividida em três seções: Identidade, Perspectiva e Etiologia. Na seção Identidade, os pacientes relatam sintomas que acreditam estar associados à MF. A soma desses sintomas é o total para essa seção. De acordo com as instruções da escala, sintomas relevantes para MF foram adicionados. A seção Perspectiva avalia as perspectivas dos pacientes em sete subescalas: linha do tempo – aguda/crônica; linha do tempo – cíclica; consequências; controle pessoal; controle do tratamento; coerência da doença; e representações emocionais. Essas subescalas investigam respectivamente as opiniões dos pacientes em relação à cronicidade da MF, seu curso, o impacto que a doença tem em sua vida, se a MF pode ser curada pelo paciente e pelo tratamento, a compreensão da doença e os sentimentos negativos que cria, respectivamente. Os pacientes indicaram seu nível de concordância com as afirmações utilizando uma escala Likert de cinco pontos (1=discordo totalmente, 5=concordo totalmente), com escores altos representando a dominância da subescala (Alfa de Cronbach=0,43‐0,88). Por exemplo, escores mais altos na subescala aguda/crônica indicam que a MF é percebida como uma condição crônica. A última seção consiste em 18 itens relativos a como a etiologia é percebida: atributos psicológicos (crenças de que a doença foi causada por estresse e preocupações), fatores de risco – p.ex., dieta ou fatores ambientais, imunidade e acidente ou acaso. Também aqui os pacientes indicaram seu nível de concordância com as afirmações em uma escala Likert semelhante. O alfa de Cronbach foi de 0,06 para a última e 0,59‐0,92 para o restante e, portanto, foi omitido.

As estratégias de enfrentamento foram avaliadas pela Mental Adjustment to Cancer Scale, a MINI‐MAC.15 Esse instrumento de 29 itens consiste em cinco subescalas: desesperado‐desamparado; preocupação ansiosa; espírito de luta; anulação cognitiva; e fatalismo (Alfa de Cronbach=0,62‐0,88). Editamos o item 13 e excluímos “Preocupo‐me com a recorrência do câncer” por ser irrelevante. Os pacientes foram questionados sobre seu grau de concordância com as afirmações no momento do preenchimento do questionário em uma escala Likert de quatro pontos (1=definitivamente não se aplica a mim, 4=definitivamente se aplica a mim).

A QV foi avaliada pela escala MF/SS CTCL‐QoL.16 Esse instrumento de 12 itens mede a interferência da MF na QV relacionada à saúde. Os pacientes foram questionados sobre a gravidade de sua condição nas últimas quatro semanas em uma escala Likert de cinco pontos (1=nenhuma, 5=muito grave) (Alfa de Cronbach=0,93).

A depressão e a ansiedade foram avaliadas pela Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS).17 Esse instrumento de 14 itens foi criado para avaliar sintomas de ansiedade e depressão em pacientes não somáticos. Os pacientes foram questionados sobre seu nível de concordância com as afirmações em relação à semana anterior em uma escala Likert de quatro pontos (1=o tempo todo, 4=nenhuma) (Alfa de Cronbach=0,64‐0,75).

Análise de dados

A análise estatística foi realizada utilizando‐se o software SPSS, versão 22. O coeficiente de correlação de Pearson foi calculado para avaliar as relações entre as variáveis contínuas. Uma análise de medidas repetidas (em relação ao sujeito) com contraste planejado foi usada para identificar a causa percebida da doença mais dominante e a estratégia de enfrentamento mais empregada. Exploramos um modelo de mediação no qual a relação entre os componentes da percepção da doença (variáveis independentes) e a QV (variável dependente) são mediados por mecanismos de enfrentamento. A análise foi baseada no procedimento proposto por Hayes & Scharkow, utilizando uma macro desenvolvida para SPSS.18,19

Resultado

Um total de 30 pacientes (25 homens, 5 mulheres), todos em estágio I de MF, responderam a todos os questionários e foram incluídos no estudo. Um paciente se recusou a cooperar. Os dados demográficos e clínicos são descritos na tabela 1. A média de idade foi de 51,6 anos (variação de 22–73), a duração mediana da doença foi de 55 meses e a mediana do tempo desde o início dos sintomas até o diagnóstico foi de 10 meses. A maioria dos pacientes respondeu bem apenas com fototerapia e corticosteroides tópicos (tabela 1).

Tabela 1.

Dados demográficos e clínicos dos pacientes

Variável  Média (DP) ou contagem (%), variação 
Idade (em anos)  51,60 (13,65) 
Sexo masculino  25 
Sexo feminino 
Estado civil   
Solteiro(a)  3 (10%) 
Casado(a)  24 (80%) 
Divorciado(a)  3 (10%) 
Escolaridade (em anos)  14,76 (3,04) 
No de filhos  2,17 (0,88) 
Tempo desde o diagnóstico (em meses)  58,68 (64,73), 4360 
Tempo até o diagnóstico (em meses)  20,28 (22,40), 184 
Resposta ao tratamento   
Resposta completa  75% 
Resposta parcial  22% 
Sem resposta  3% 
Modalidades de tratamentoa   
Corticosteroides tópicos  3,7% (100%) 
Fototerapia  88,9% (96%) 
Retinoides sistêmicos (acitretina, bexaroteno)  7,4% (18,5%) 
Mostarda nitrogenada tópica  7,4% 
a

No momento do preenchimento dos questionários (% como tratamento anterior).

Os escores do IPQ‐R mostraram que os participantes percebem a MF como uma condição crônica (3,7±0,9) com natureza cíclica leve (2,84±0,74), o que é bastante realista. Os pacientes não perceberam as consequências da MF como importantes (2,78±0,83), mas atribuíram um impacto emocional moderado da doença em suas vidas (3,1±0,83). Embora percebam seu controle pessoal sobre a doença (2,86±0,74) e seu nível de coerência (2,95±0,86) como bastante baixos, os pacientes demonstraram forte crença no controle pelo tratamento (3,59±0,72). Na subescala de identidade (5,57±3,11), os sintomas mais comumente relatados foram eritema (93%), pele seca (86%), prurido e alterações na cor da pele (70%). A fim de investigar se a percepção da doença muda ao longo do tempo, os pacientes recém‐diagnosticados foram comparados com os pacientes com doença bem estabelecida (ponto de corte de dois anos). Verificou‐se que os pacientes com doença bem estabelecida percebem sua doença como mais crônica (t=2,56, p <0,05) em comparação aos pacientes recém‐diagnosticados. Nenhuma outra diferença significativa foi encontrada.

Em relação aos itens causais, os atributos psicológicos – p.ex., estresse e preocupação (2,68±0,95) – foram significativamente maiores que os fatores de risco (1,9±0,47), imunidade (2,24±0,95) e acaso (2,1±0,82) (F1,28=10,08, p <0,05). Além disso, os atributos psicológicos foram positivamente correlacionados com ansiedade e depressão, consequências e representações emocionais.

O espírito de luta foi o mecanismo de enfrentamento mais comum (3,34±0,66, F1,29=50,36, p <0,01) em comparação à anulação cognitiva (2,77±0,95), fatalismo (2,62±0,92), preocupação ansiosa (2,25±0,83) e desamparo (1,4±0,80).

Em relação à QV, 57,1% relataram que a MF interfere levemente em sua QV, 16,7% relataram interferência moderada, 9,5% relataram interferência substancial ou acentuada e 9,5% relataram MF como tendo nenhuma ou pouca interferência em sua QV.

Os escores das subescalas de depressão e ansiedade foram 3,37±0,4 e 2,85±0,52, respectivamente, o que significa que os pacientes não estavam deprimidos e apenas levemente ansiosos.

Relação entre percepção da doença, resultados psicológicos e dados demográficos

Foi encontrada uma correlação positiva entre a duração da doença com a MF sendo percebida como crônica, e uma correlação negativa com crenças na eficácia do tratamento. O período de tempo decorrido desde o início dos sintomas até o diagnóstico e a modalidade de tratamento não se correlacionaram com os componentes de percepção da doença. Naturalmente, a resposta ao tratamento correlacionou‐se com a percepção quanto melhor a resposta, menos os pacientes sentem que a MF afeta suas vidas (r=0,39, p <0,05) e a carga emocional é reduzida (r=0,40, p <0,05). A QV correlacionou‐se negativamente com várias subescalas de percepção da doença: identidade, representações emocionais, consequências e atributos psicológicos e enfrentamento deficiente (desamparo e preocupação ansiosa). Depressão e ansiedade também se correlacionaram positivamente com o comprometimento da QV. Em contraste, a QV se correlacionou positivamente com a coerência da doença.

O espírito de luta foi correlacionado positivamente com crenças mais fortes no controle pelo tratamento e negativamente correlacionado com representações emocionais (o vivenciar de sentimentos negativos). Embora não seja uma estratégia de enfrentamento dominante, o desamparo se correlacionou significativamente com a maioria das variáveis; correlacionou‐se positivamente com ansiedade e depressão, identidade, atributos psicológicos, representações emocionais e comprometimento da QV, e negativamente com coerência e crenças no controle da doença pelo tratamento (tabela 2).

Tabela 2.

Correlações significativas entre todas as variáveis do estudo

Variável  Atributos psicológicos  Fatores de risco  Espírito de luta  Desamparo  Preocupação ansiosa  Anulação  Depressão  Ansiedade  Comprometimento da qualidade de vida  Idade  Tempo desde Dx 
Identidade    0,37a    0,60b  0,44a    0,49b  0,48b  0,48b     
Linha do tempo aguda/crônica                      0,61b 
Linha do tempo cíclica            0,42a           
Consequências  0,60b  0,41a    0,67b  0,63b    0,55b  0,73b  0,73b     
Controle pessoal                       
Controle pelo tratamento      0,51b  0,54b      0,38a        0,53b 
Coerência sobre a doença  0,42a    0,39a  0,49b      0,36a    0,59b     
Representações emocionais  0,57b  0,45a  0,43a  0,65b  0,72b    0,60b  0,70b  0,57b  0,43a   
Atributos psicológicos        0,60b  0,55b    0,44a  0,59b  0,67b     
Imunidade        0,39a          0,44a     
Fatores de risco              0,38a  0,58b       
Espírito de luta                       
Desamparo              0,83b  0,66b  0,79b     
Preocupação ansiosa              0,75b  0,74b  0,70b     
a

p <0,05.

b

p <0,01.

O modelo de mediação demonstrou que o efeito significativo dos atributos psicológicos na QV foi mediado pelo desamparo. O controle do desamparo resulta em uma relação não significativa entre os atributos psicológicos e a QV; ou seja, a relação entre os atributos psicológicos e a QV foi totalmente mediada pelo desamparo (fig. 1).

Figura 1.

Estratégias de enfrentamento como mediador entre a percepção da doença e a qualidade de vida.

(0,08MB).
Discussão

Embora a MF possa ser doença potencialmente fatal, a percepção da doença pelos pacientes foi otimista. Ao contrário de pacientes com doenças benignas, como alopecia e psoríase, aqui os pacientes sentem que a MF tem consequências menos negativas, como observado anteriormente.20–22 Ao contrário dos pacientes dermatológicos comuns (não cancerosos),22 os pacientes com MF acreditam que seu tratamento é eficaz – como foi demonstrado geralmente para pacientes com câncer, mas infelizmente com o tempo essa sensação diminuiu. Além do quadro positivo, os níveis de depressão e ansiedade foram baixos, em oposição à alta prevalência de depressão entre pacientes dermatológicos, e a QV foi alta.23–25 Todos esses achados em conjunto podem ser parcialmente atribuídos ao fato de que, neste estudo, os pacientes estavam no estágio I, que tem excelente resposta às terapias direcionadas à pele e prognóstico excelente.22 Possivelmente, pacientes com MF em estágio avançado apresentariam um perfil menos positivo.

No entanto, alguns achados devem ser abordados. Em primeiro lugar, a maioria dos pacientes acredita que sua doença foi causada por estresse e preocupação, semelhante aos pacientes com dermatite atópica.26 A atribuição desses fatores psicológicos está correlacionada com altos níveis de depressão e ansiedade e com comprometimento da QV. O modelo de mediação mostra que o efeito negativo que os fatores psicológicos negativos têm na QV é mediado pela estratégia de enfrentamento do desamparo. Portanto, pode‐se supor que o efeito adverso do estresse e das preocupações sobre a QV pode ser eliminado seguindo estratégias de enfrentamento adaptativas, como o espírito de luta. Além disso, parece que os pacientes que se sentem desamparados acreditam que a MF tem um grande impacto em suas vidas e em seu universo emocional. Eles acreditam pouco em seu tratamento e em sua autocapacidade de controlar a MF, e a doença constitui um componente fundamental de sua identidade. A implicação clínica desse fato é que é necessário melhorar as estratégias de enfrentamento adaptativas no manejo dos pacientes.

Outra descoberta pertubadora é a fraca coerência dos pacientes em relação à doença. Diferente de pacientes com câncer, os pacientes dermatológicos, inclusive na amostra atual, não sentem que entendem suas doenças.20,21,23 Uma possível explicação é a mídia e as discussões sociais relativamente limitadas sobre a MF, em comparação com o câncer. Quando uma condição é considerada ambígua, ela gera mais ameaça, o que pode fazer com que os pacientes se sintam desamparados e vulneráveis. De acordo com o modelo CSM, fornecer aos pacientes informações sobre sua doença e as ações necessárias para lidar com ela são fatores importantes para a aderência ao tratamento a longo prazo e melhores estratégias de enfrentamento.5 Neste estudo, descobrimos que a coerência sobre a doença foi negativamente correlacionada com os atributos psicológicos, o desamparo, o comprometimento da QV e a depressão. Isso significa que há um profundo efeito emocional e cognitivo negativo quando os pacientes sentem que não entendem adequadamente sua condição médica. Portanto, uma grande importância deve ser colocada em dedicar tempo para educar os pacientes sobre sua doença.

A limitação deste estudo foi o fato de que apenas pacientes com MF em estágio inicial foram incluídos. Não está claro se as conclusões podem ser generalizadas para pacientes com MF em estágio avançado. Entretanto, pensamos que seria importante investigar pacientes em estágio inicial, “que se comportam” como pacientes com doenças de pele comuns, em vez de pacientes em estágio avançado que podem comportar‐se de forma semelhante aos pacientes com câncer. Além disso, os pacientes foram recrutados na mesma clínica e tratados pelo mesmo especialista. Sabe‐se que as características e o estilo de comunicação dos médicos têm um forte efeito nos resultados comportamentais, emocionais e psicológicos dos pacientes, incluindo satisfação e QV.27,28 É razoável supor que diferentes atitudes e mensagens dos médicos resultem em diferentes percepções da doença pelos pacientes, especialmente quando se trata de uma doença rara. Isso instiga investigações adicionais da conexão entre as características dos médicos e a percepção da doença pelos pacientes.

Conclusão

Geralmente, os pacientes com MF em estágio inicial apresentam perspectivas favoráveis em relação à doença, boas estratégias de enfrentamento e baixo comprometimento da QV. No entanto, os pacientes que percebem fatores psicológicos negativos como a etiologia de sua doença, e aqueles cuja estratégia de enfrentamento é o desamparo, precisam de intervenções psicológicas adequadas, pois podem sofrer de depressão e comprometimento em sua QV. Na era da medicina personalizada, com foco em mutações individuais e terapia com biológicos, os aspectos psicológicos do paciente também devem ser considerados. Mais pesquisas devem ser feitas para expandir nossa compreensão das necessidades psicológicas dos pacientes com MF, com ênfase na coerência sobre a doença.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Oz Segal: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Naama Trumper: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; revisão crítica da literatura.

Felix Pavlotsky: Aprovação da versão final do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa.

Gil Goldzweig: Análise estatística; aprovação da versão final do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.

Aviv Barzilai: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa.

Conflito de interesses

Nenhum.

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Como citar este artigo: Segal O, Trumper N, Pavlotsky F, Goldzweig G, Barzilai A. Illness perception, coping, and quality of life in early‐stage Mycosis fungoides. An Bras Dermatol. 2021;96:27–33.

Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, The Chaim Sheba Medical Center, Tel Hashomer, Ramat Gan, Israel.

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