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Vol. 100. Núm. 4.
(1 julho 2025)
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Botriomicose: série de casos diagnosticados entre 2000 e 2023 na divisão de Dermatologia de hospital terciário
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Nicole de Souza Aranha
, João Avancini, Caroline Heleno Chagas de Carvalho, Walter Belda Júnior, Marcello Menta Simonsen Nico
Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
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Tabela 1. Resumo dos casos de botriomicose
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Prezado Editor,

A botriomicose é doença granulomatosa crônica rara, podendo apresentar‐se como doença cutânea ou visceral.1 É importante a diferenciação de outras doenças que produzem grãos como forma parasitária do agente etiológico, incluindo eumicetoma e actinomicose, com vistas a tratamento direcionado e assertivo, evitando a progressão da doença e garantindo melhor a qualidade de vida dos indivíduos acometidos.

Portanto, o objetivo desta série de casos é apresentar sete casos de botriomicose atendidos em um serviço universitário de Dermatologia, de janeiro de 2000 até 2023 analisando as características individuais dos pacientes, localizações das lesões, abordagens terapêuticas e respostas aos tratamentos propostos.

A tabela 1 resume as principais informações dos casos. Foram acompanhados sete pacientes, dos quais cinco do sexo masculino e dois do sexo feminino. As idades de início do quadro variam entre 17 e 79 anos. Cinco casos tiveram lesão nos pés, um na perna e um no dorso das mãos e quirodáctilos. Apenas três casos relataram trauma prévio. Um paciente apresentava histórico de síndrome de Cushing secundária a microadenoma hipofisário, que foi excisado por meio de cirurgia transesfenoidal. Outro paciente apresentava histórico de imunossupressão com 38 sessões de radioterapia em decorrência de câncer de próstata, porém, posteriormente ao início do quadro cutâneo. Dois casos apresentavam outras comorbidades, como hipertensão arterial sistêmica, insuficiência cardíaca congestiva, hipotiroidismo, dislipidemia. Três casos não tinham comorbidades.

Tabela 1.

Resumo dos casos de botriomicose

Idade  Sexo  Localização  Agente  Tratamento  Evolução 
17  Masculino  Mãos  Staphylococcus aureus  Sulfametoxazol e trimetoprim  Melhora 
33  Masculino  Pé  Staphylococcus aureus  Sulfametoxazol e trimetoprim  Melhora 
17  Masculino  Pé  Staphylococcus aureus  Múltiplos esquemas antibióticos  Piora progressiva, necessitando de amputação 
17  Masculino  Pé  Staphylococcus aureus  Sulfametoxazol e trimetoprim  Melhora 
79  Masculino  Pré tibial  Staphylococcus aureus  Sulfametoxazol e trimetoprim  Perda de seguimento 
44  Feminino  Pé  Staphylococcus warneri  Sulfametoxazol e trimetoprim  Melhora e recidiva 
34  Feminino  Pé  Não relatado  Ressecção cirúrgica e sulfametoxazol e trimetoprim  Perda de seguimento 

A maioria apresentava‐se clinicamente com nódulos e tumorações com trajetos fistulosos e três casos apresentavam saída de grãos. Nenhum paciente teve sintomas sistêmicos, exceto um, que evoluiu para anemia e plaquetopenia por sangramento continuado da lesão.

O microrganismo isolado foi Staphylococcus aureus em seis casos. Staphylococcus warneri foi cultivado repetidamente em um caso.

Em todos os casos o tratamento foi realizado com uso de sulfametoxazol associado a trimetoprima (800+160mg) por volta de seis meses a dois anos. Três pacientes tiveram boa resposta e dois tiveram perda de seguimento. Em um dos casos foi proposta ressecção cirúrgica associada a amicacina, porém o doente não concordou com o procedimento e não retornou às consultas. Um paciente não respondeu a todos os tratamentos com antibióticos e antifúngicos, e, após dois anos, foi necessária amputação transtibial decorrente de dificuldade de locomoção e perda sanguínea pela lesão.

A botriomicose é doença granulomatosa crônica rara, causada por bactérias não filamentosas, das quais a principal é Staphylococcus aureus. Outras bactérias ocasionalmente envolvidas são Pseudomonas spp., Escherichia coli, Proteus spp. e Streptococcus spp. O termo botriomicose deriva do grego botrys (grãos); micose (fungo), pois acreditava‐se que o quadro era de origem fúngica.1,2

A patogênese da doença não é bem estabelecida. Acredita‐se que um complexo antígeno‐anticorpo, imunoglobulina G e C3 são precipitados ao redor dos microrganismos, fazendo com que a fagocitose e a destruição bacteriana intracelular sejam evitadas.1

A condição acomete geralmente áreas propensas a trauma e pode apresentar‐se como doença cutânea ou visceral.3 A forma cutânea manifesta‐se clinicamente como tumores ou placas que apresentam em sua superfície aberturas de trajetos fistulosos que drenam grãos de cor branca, podendo invadir tecidos profundos levando a extensa destruição local.4–6

O diagnóstico inclui a suspeita clínica, estudos histopatológicos e microbiológicos. É importante a diferenciação de outras doenças que produzem grãos como forma parasitária do agente etiológico, incluindo eumicetoma e actinomicose (figs. 1‐4).2,5

Figura 1.

Clínica. (A) Tumoração com presença de fístulas em diferentes fases de evolução localizadas na planta do pé direito. (B) Múltiplos nódulos profundos nos quirodáctilos e dorso de ambas as mãos, com trajetos fistulosos com drenagem de secreção purulenta.

Figura 2.

Tomografia computadorizada do pé direito demonstrando volumoso tecido sólido expansivo e infiltrativo com extenso acometimento ósseo e de partes moles.

Figura 3.

Grão de botriomicose analisado por meio de exame microscópico direto, em que é possível observar agregados em cocos.

Figura 4.

Histopatologia. (A) Corte histológico demonstrando dermatite granulomatosa crônica supurativa contendo um grão na derme profunda (Hematoxilina & eosina, 40×). (B) Estruturas arredondadas formando um grão, envolvidas pelo fenômeno de Splendore-Hoeppli (Hematoxilina & eosina, 400×).

Ao exame histopatológico é possível identificar o tipo de microrganismo, uma vez que no eumicetoma os grãos são compostos por fungos verdadeiros. No actinomicetoma é possível visualizar bactérias filamentosas, e os grãos de botriomicose são constituídos por bactérias não filamentosas. Colorações histoquímicas como Grocott e Gram são úteis para a caracterização de fungos e bactérias.2

O tratamento envolve antibioticoterapia direcionada, abordagem cirúrgica com desbridamento local; em seletos casos, quando ocorre falha na resposta a antibióticos e quando o membro se torna disfuncional, pode ser necessária a amputação do membro afetado, como ocorreu em um de nossos casos.2

A maioria das publicações sobre o assunto é de relatos de casos. Em virtude de sua raridade, há poucas séries publicadas. A diagnose precoce da botriomicose deve favorecer a prognose e a resposta ao tratamento, pois casos extensos apresentando grande volume e fibrose apresentam má resposta aos agentes terapêuticos.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Nicole de Souza Aranha: Concepção e o desenho do estudo; levantamento dos dados; redação do artigo; interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; aprovação final da versão final do manuscrito.

João Avancini: Análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta terapêutica de casos estudados; aprovação final da versão final do manuscrito.

Caroline Heleno Chagas de Carvalho: Análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta terapêutica de casos estudados; aprovação final da versão final do manuscrito.

Walter Belda Júnior: Análise e interpretação dos dados; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta terapêutica de casos estudados; aprovação final da versão final do manuscrito.

Marcello Menta Simonen Nico: Concepção e o desenho do estudo; análise e interpretação dos dados; revisão crítica do conteúdo intelectual importante; participação efetiva na orientação da pesquisa; participação intelectual em conduta terapêutica de casos estudados; aprovação final da versão final do manuscrito.

Conflito de interesses

Nenhum.

Referências
[1]
L.P. González-Cardona, A.M. Alejo Villamil, C. Cortés Correa, E.O. Peñaranda Contreras.
Exophytic botryomycosis: an unusual clinical presentation.
An Bras Dermatol., 97 (2022), pp. 536-538
[2]
C. Padilla-Desgarennes, D. Vázquez-González, A. Bonifaz.
Botryomycosis.
Clin Dermatol., 30 (2012), pp. 397-402
[3]
W. Belda Jr., P.R. Criado, L.F. D Passero.
Botryomycosis in patient with pituitary microadenome: a case report.
Dermatol Ther., 33 (2020), pp. e13529
[4]
H. Shimagaki, A. Yuki, K. Kimura, D. Yuki, H. Fujikawa, N. Shimizu, et al.
Case of cutaneous botryomycosis in an 8‐year‐old immunocompetent boy with a review of the published work.
J Dermatol., 47 (2020), pp. 542-545
[5]
C.S. Sirka, G. Dash, S. Pradhan, S. Naik, A.N. Rout, K. Sahu.
Cutaneous botryomycosis in immunocompetent patients: a case series.
Indian Dermatol Online J., 10 (2019), pp. 311-315
[6]
K. John, K. Gunasekaran, T.A. Kodiatte, R. Iyyadurai.
Cutaneous botryomycosis of the foot: a case report and review of literature.
Indian J Med Microbiol., 36 (2018), pp. 447-449

Como citar este artigo: Aranha NS, Avancini J, Carvalho CH, Belda Jr W, Nico MM. Botryomycosis: series of cases diagnosed between 2000 and 2023 in the Dermatology division of a tertiary hospital. An Bras Dermatol. 2025;100:501144.

Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

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Anais Brasileiros de Dermatologia (Portuguese)
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