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Vol. 95. Issue 6.
Pages 740-742 (November - December 2020)
Dermatologia Tropical/Infectoparasitária
Open Access
Paracoccidioidomicose: manifestação clínica incomum
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Bruno Augusto Alvaresa, Cláudia Alves Lapa Graciab, Mariangela Esther Alencar Marquesa, Silvio Alencar Marquesa,
a Departamento de Dermatologia e Radioterapia, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil
b Clínica Privada, Birigui, SP, Brasil
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Resumo

Paracoccidoiomicose é uma micose sistêmica com maior incidência no sexo masculino, história de exposição ao meio ambiente rural e manifestação clínica clássica de lesão oropulmonar. Os autores relatam um caso de paciente do sexo feminino, urbana, de 76 anos e com quadro clínico − dermatológico atípico e conclusão diagnóstica após exame histopatológico. A resposta clínica foi rápida e plena com itraconazol 400mg/dia no primeiro mês seguido por 200mg/dia até completar seis meses de tratamento.

Palavras‐chave:
Diagnóstico
Doenças da pele e do tecido conjuntivo
Idoso
Paracoccidioidomicose
Terapêutica
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Introdução

A paracoccidioidomicose é uma micose sistêmica causada por fungos dimórficos do gênero Paracoccidioides (P. brasiliensis ou P. lutzii),1 que, na forma clínica crônica do adulto, compromete principalmente homens, razão masculino/feminino de até 22:1, e predomina na faixa de 30 a 59 anos.2 O comprometimento dos pulmões e da mucosa oral é o usual nessa forma clínica.

Relato do caso

Relatamos o caso de uma paciente do sexo feminino, 76 anos, que se queixava de lesões cutâneas dolorosas havia dois meses. Negava trauma e febre e havia se submetido a tratamento com antibióticos sem melhoria. De antecedentes, relatava diabetes mellitus tipo II e hipertensão arterial sistêmica. Ao exame dermatológico, apresentava úlceras fagedênicas com áreas necróticas, circundadas por halo inflamatório (figs. 1 e 2). As lesões eram mais exuberantes nas regiões deltoides, com lesões satélites nos ombros e antebraços. Exame clínico complementar foi normal, embora a paciente apresentasse aspecto depressivo e em sofrimento por sua enfermidade.

Figura 1.

Paracoccidioidomicose: lesões ulceronecróticas, fagedênicas, com áreas recobertas por crostas, acometem braço e antebraço direito.

Figura 2.

Paracoccidioidomicose: lesão ulceronecrótica extensa, áreas recobertas por crostas e com halo inflamatório intenso. Pápulas e placas satélites. Localizadas no braço e antebraço esquerdo.

As hipóteses clínicas foram de pioderma gangrenoso, pela presença de úlceras dolorosas de crescimento rápido e aspecto geográfico, mas não havia halo violáceo e as bordas não eram subminadas. Ou criptococose cutânea primária devido ao aspecto inflamatório associado à necrose, localização em áreas expostas, mas a bilateralidade das lesões não correspondia a essa hipótese. Foram feitas biópsias e investigação laboratorial e o diagnóstico final de paracoccidioidomicose foi surpreendente e confirmado pelo exame histopatológico (figs. 3 e 4) e exame micológico direto. Exames complementares, inclusive tomografia computadorizada (TC) de tórax e abdome, afastaram comprometimento de outros órgãos. Exames laboratoriais revelaram PCR e glicemia elevados, sorologia anti‐HIV e anti‐P. brasiliensis negativas, assim como a cultura para bactérias e fungos. O tratamento foi feito com itraconazol 400mg/dia por 30 dias seguido por 200mg/dia, até completar seis meses, com completa resolução clínica.

Figura 3.

Paracoccidioidomicose: infiltrado inflamatório crônico granulomatoso com presença de células fúngicas no interior do citoplasma de células gigantes e macrofágicas (Hematoxilina & eosina, 400×).

Figura 4.

Paracoccidioidomicose: Paracoccidioides spp. Células fúngicas exibem o clássico Mickey Mouse (Grocott Gomeri. Imersão, 1000×).

O caso apresentado difere do padrão usual da paracoccidioidomicose em vários aspectos. A enfermidade é incomum tanto no sexo feminino quanto no paciente idoso. E, como regra em pacientes adultos, o comprometimento pulmonar está presente e é a fonte de disseminação metastática da infecção para outros órgãos.3 O comprometimento pulmonar não foi identificado mesmo com a TC de alta resolução.4 No entanto, o mais incomum foi o padrão das lesões cutâneas. Na paracoccidioidomicose, as lesões na pele ocorrem em até 62,1% dos casos, mas usualmente na face, como lesões acneiformes, em placas infiltradas ou vegetantes e simultaneamente a comprometimento de múltiplos órgãos, inclusive os pulmões.5 Úlceras com áreas necróticas é apresentação incomum, pois as úlceras cutâneas na paracoccidioidomicose são em geral rasas, granulosas, usualmente apresentam pontos hemorrágicos à semelhança do observado nas lesões mucosas e não são fagedênicas ou dolorosas.5

Idade avançada, imunossenescência e diabetes mellitus provavelmente contribuíram para a rápida evolução e apresentação atípica neste caso.6,7 Itraconazol tem sido considerado como primeira opção para o tratamento e é efetivo na dose de 200mg/dia por nove a 18 meses.8 Usamos, com sucesso, 400mg/dia no primeiro mês com o objetivo de promover rápida resolução das lesões, melhoria na qualidade de vida e na redução do estresse psicológico vivenciado pela paciente.

Suporte financeiro

Nenhum.

Contribuição dos autores

Bruno Augusto Alvares: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados.

Cláudia Alves Lapa Gracia: Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Mariangela Esther Alencar Marques: Aprovação da versão final do manuscrito; participação intelectual em conduta propedêutica e/ou terapêutica de casos estudados; revisão crítica do manuscrito.

Silvio Alencar Marques: Aprovação da versão final do manuscrito; concepção e planejamento do estudo; revisão crítica do manuscrito.

Conflitos de interesse

Nenhum.

Referências
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Como citar este artigo: Alvares BA, Gracia CAL, Marques MEA, Marques SA. Paracoccidioidomycosis: an uncommon clinical presentation. An Bras Dermatol. 2020;95:740–2.

Trabalho realizado no Departamento de Dermatologia e Radioterapia, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil.

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